sexta-feira, 15 de novembro de 2024

Carta para Nala

 Oi, Naleta.

Quarta fez uma semana que você se foi. Hoje acordei sentindo uma saudade esmagadora no meu peito. Fui lá no canil ver seu irmão, mas ele ainda tá com dificuldades para comer. Vou levar ele na tia vet.

Ele fica o tempo todo deitado no mesmo lugar que você dormiu pela última vez. É, filha... ele tá com muita saudade de você.

Sabe filha, eu to naquela fase em que eu to me perguntando se eu poderia ter feito alguma coisa. Por que você não chorou? Não latiu? Não me chamou? Você só deitou e dormiu, filha. A mamãe ainda tá muito confusa e sentindo uma dor do tamanho do mundo.

Eu quero que você saiba, filha, que eu te amei intensamente. Você era sim minha filha. Você é. E sempre vai ser.

Eu espero, de coração, que você esteja bem. Que esteja feliz, brincando com a sua irmã Pérola e com “suplimo” Huffos.

Ainda não acredito que vocês dois se foram.

Por enquanto, filha, eu ainda não consigo sequer pensar em você sem chorar. Essa ferida ainda tá sangrando. Eu to tentando ficar de boa, você sabe como eu sou. Não sou de falar dessas coisas. Mas confesso pra você que tem sido bem difícil.

 

Amo você. E sinto sua falta. Todos os dias.

domingo, 8 de setembro de 2024

A GRANDE ENGENHEIRA DAS OBRAS INACABADAS

Em algum momento da sua vida, você já ficou com aquela impressão de que não termina nada do que começa? Já teve a sensação de que a sua mente é uma caixa cheia de ideias vazias? 

Há poucos meses aconteceram algumas coisas que me fizeram cair em um precipício de dor e reflexão. Situações que me levaram a uma profunda reflexão sobre o meu papel nessa terra e a forma como o exerço.
Como acontece em todo ferimento, sentimos a imensa necessidade de estancar a dor, seja tampando com a mão para parar o sangramento ou desferindo palavras banhadas de raiva para afastar da nossa cabeça a ideia de que tudo o que está acontecendo está intrinsicamente ligado à maneira como nós mesmos nos comportamos e nos apresentamos para o mundo. 

Chamei esta de fase um.

Tomei a liberdade de nomear as fases. Chame-as como quiser. Eu acho mais organizado me organizar desta maneira. Fica mais descritivo. Sei lá. Loucura.

Quando sua visão começa a ficar menos turva e você começa a enxergar uma pequena fresta de luz, você está atingindo a fase dois. Nem sempre acontece. Você começa e ter alguns sentimentos diferentes dos que você estava experimentando até agora. Você pensa que, se tivesse pisado no freio alguns segundos antes, o carro não teria batido. Se não tivesse reagido desproporcionalmente no momento inoportuno, aquela briga não teria acontecido. Mas não se engane. Nesta fase, o campo de visão ainda está encurtado e enxergando apenas aquela situação. As “culpas” começam a aflorar, como se estabelecer um culpado fosse te fazer se sentir menos culpado.


Então, depois de alguns momentos de total desespero, lágrimas e muita coca-zero, você começa a finalmente entender. Reconhecer. Fase três. 

Essa é a a fase em que você começa a expandir esse campo de visão e perceber que, em vários momentos da sua vida que você sentiu dor, desconforto, medo, a sua fase um foi a fase final. Você não conseguiu sair dela. Ela foi tudo que você conseguiu atingir, seja pros seus planos, sonhos, relacionamentos. Você não conseguiu entender a frustração de um não, a fragilidade de um pedido de ajuda, mesmo que disfarçado de grosseria. Você sentiu uma dor tão grande (e aqui não cabe entendermos os porquês), que você precisava estancar. Você só precisava acabar com aquilo, de alguma forma e acabou. Você se afastou de pessoas por medo de conflitos. Você se afastou de lugares, por medo de gerar nos outros desconfortos com decisões que você precisava tomar para a sua vida. Você se afastou de você mesma, por medo de sua própria companhia. 

Acreditem, acontece muito.

O tempo passa e você vai acumulando essas “obras inacabadas”. São essas situações – pequenas ou não – em que você não conseguiu, de fato, concluir nada. Você simplesmente optou por se afastar porque algo lhe parecia mais real, mais tangível, mais importante do que qualquer outra coisa.

E essas tais obras, de tempos em tempos, te visitam. Te revisitam. Te tonteiam.

Há obras finalizadas. Mesmo que deixem a sensação de que não foram, foram.

Há outras que você vai precisar revisitar. E talvez reescrever.

Não tenha medo. Revisite.

sexta-feira, 16 de agosto de 2024

ATOTÔ

 

Fé, pra mim, sempre foi um tema bem complicado. Complicado no sentido de acreditar mesmo. Fui criada em escola católica, década de 80, aprendendo que Deus punia aqueles que não faziam exatamente o que Ele queria. Me apresentaram um Deus quase odioso, meio raivoso, que, segundo eles, pregava que tínhamos o tal do "livre arbítrio", mas que de livre não tinha nada porque, se o caminho que você escolhesse fosse desaprovado por Deus, você iria sofrer na eternidade do fogo do Inferno.

 Nunca consegui entender esse Deus que me disseram que existia.

Diziam também que esse mesmo Deus era amor e que tudo acontecia por vontade dele. E isso me assustava ainda mais. Como poderia Deus, onipotente, onipresente, onisciente, ver um filho sofrendo as mazelas da vida e permitir que isso acontecesse, se, também segundo os detentores da sabedoria divina, depois que morrêssemos, ficaríamos ao lado dele para todo sempre apenas se fôssemos merecedores? Merecedores? Como? Como se conquistava esse merecimento? Não era claro. Eu não entendia.

Mas eu cresci. Assim como minha consciência de mundo. E entendi que o Deus a quem se referiam não passava de um reflexo das crenças interiores de cada uma dessas pessoas. Entendi que o Deus cristão era diferente do que diziam que era. E também entendi que eu não cabia dentro da fé cristã, talvez de forma inconsciente porque nunca, de fato, parei para refletir a respeito de religiões e fé.

E foi lá pelos meus vinte e bem poucos anos conheci o espiritismo e suas variantes.

E, pra mim, tudo começou a fazer sentido. O quebra-cabeça das dúvidas começou a se encaixar.

Hoje, eu profiro minha fé das mais variadas maneiras. Eu rezo, canto, entoo mantras, jogo pro universo, emano raios, visualizo...

Mas é ELE, meu pai, quem me arrepia a alma. É ele que faz meu corpo estremecer, minhas pernas desobedecerem e me faz, inconscientemente, dançar.

É meu pai, meu protetor, meu grande amigo, meu alento nas horas de desespero e meu companheiro nas horas felizes.

Eu entendi minha fé e, hoje, estou em paz com ela. Hoje sei que minha fé vai muito além do clichê "fé é acreditar no que não se vê". Entendi que fé também requer maturidade. Entendi que fé é particular, encantada, serena e perene.

Hoje é dia de Atotô. Atotô quer dizer silêncio. Hoje é dia de silenciar a alma pra ouvir o coração. Porque foi lá que Jagun fez sua morada e é de lá que Jagun me mostra o caminho certo. Atotô quer dizer silêncio. Porque, quando você se cala, fica mais fácil de ouvir.

 

Atotô ajuberô.

 

Awure.

Carta para Nala

 Oi, Naleta. Quarta fez uma semana que você se foi. Hoje acordei sentindo uma saudade esmagadora no meu peito. Fui lá no canil ver seu irm...