No final de 2020 peguei COVID. Sei
exatamente o dia que peguei, porque foi justamente na minha primeira aglomeração. Dia 02/11/2020. Fui fotografar. Precisava complementar minha renda porque sofri
reduções salariais bruscas ao longo do ano da pandemia. Entretanto, independente
do quanto meu salário tenha sido reduzido, eu nunca parei de produzir. Dava
aula para 4 turmas por dia, de segunda a quinta. Gravava 16 vídeo aulas por
semana, de turmas entre o segundo e o quinto ano. Essas eram as minhas principais
funções. Dentre outras milhares de coisas que fazia. Na mesma semana que comecei
os sintomas do COVID precisei faltar duas aulas, porque estava realmente me sentindo
mal e também mandei um e-mail pedindo minha redução de função e de carga
horária, tendo em vista que precisava, de fato, fazer outra coisa para que a grana
entrasse e eu pudesse me sustentar novamente. 3 dias depois um email
suspendendo meu contrato de trabalho por ter causado prejuízos para a
instituição devido as duas faltas da semana anterior. EU ESTAVA COM COVID! E assim mesmo! Por email. Distante.
Seco. Frio. Feio. Confesso que não me espantou porque ao longo dos 3 longos anos que trabalhei lá vi isso acontecer com outras pessoas. Digo longos porque, por nunca ter sido
uma funcionária regular, eu vivia cada um dos minutos que ali estava. Chegava
mais cedo que todos, saía mais tarde. Sempre. Dava aula no turno da manhã,
gerenciava o que precisava gerenciar a tarde. Nunca hesitei em pegar meu carro
e viajar de bate e volta para região dos lagos para fazer reuniões, resolver
problemas que, de fato, não eram meus. Fiz muito mais do que recebia para fazer
e sempre fiz com gosto, porque meu trabalho nunca foi somente trabalho. Eu
simplesmente amava o que fazia. Chegar na escola as 7 da manhã e ser
recepcionada com aquelas carinhas pequenas e inchadas era o máximo! Meu
combustível. Depois, mesmo exausta, mesmo sentindo dores que ninguém poderia
dimensionar (porque não sou muito de falar do que sinto), eu voltava pro
escritório e fazia tudo de novo, sempre pensando em apresentar melhores resultados.
Sempre pensando em levar para os meus alunos e os alunos de tantas outras
escolas o melhor que poderíamos dar. Lutei por uma causa que não era tão minha
quanto achei que era. E fui descartada, como se nunca tivesse por ali passado.
Até agora não me encontrei em mim
mesma. Não sei o que vai ser de mim quando anunciarem o retorno das aulas.
Porque não era qualquer escola, era aquela escola. Não eram quaisquer alunos,
eram aqueles alunos. Porque eu sou assim. Sou por inteiro onde quer que eu
pise.
Estou recomeçando. Hoje numa
carreira diferente. Aos 38 anos me pego na cadeira de aluna, aprendendo como
fazer, como melhorar, como crescer. O tempo é cruel muitas vezes, mas dessa vez
ele está sendo meu aliado. Porque, por mais que eu tenha passado por tudo que
passei (e ainda estou passando), não me falta absolutamente nada. Não me falta
um teto, comida, afeto, amor. Não me falta apoio daqueles que estão comigo pro
que der e vier. Não me falta uma família que me auxilia, seja me ajudando a
pagar as contas, seja me ouvindo lamentar, seja me incentivando porque estou
emagrecendo e cuidando mais da minha saúde.
Esse desabafo não é um gesto de
autopiedade, tampouco um desabafo de autolamentação. Na verdade é o oposto
disso. É um desabafo de gratidão.
Gratidão ao Poder Superior por me
mostrar, sempre, quem é quem. Por me manter intacta contra esse tipo de maldade,
contra essa falta de humanidade. É gratidão por ter na minha vida pessoas que me
procuram só para saber como estou, se está pintando algum job, se está faltando
alguma coisa. Por ter na minha vida seres humanos que são, muito mais do que
precisam aparentar ser.
Não adianta ter um postura de compaixão
com o próximo se não cuidas daqueles que estão ao seu lado. Cuide dos teus!
Sempre!
Não to curada ainda. A dor de vez
em quando me pega firme e me deixa pequenininha, querendo colo. Há dias que
quero gritar, outros me enfio numa concha e só consigo pensar. Mudar de rumo requer
uma bússola bem alinhada e a minha ainda não está.
E apesar disto, sou grata!